terça-feira, 14 de novembro de 2017

À sombra desta mangueira - reflexões


   
     Dialogicidade é a proposta de Paulo Freire tendo em vista a liberdade de questionar, refletir e discutir em sala de aula, tendo como princípios a natureza humana e a democracia. A comunicação está presente em toda ação humana como fenômeno vital e a informação encurta o tempo e o espaço. 
     Somos seres finitos e inacabados e a consciência disso nos faz buscar constantemente um algo mais, um educar-se. Sem esta consciência seríamos como animais adestrados ou como plantas, cultivadas. O saber-se finito e inacabado permite que sejamos educados. Aí também reside a esperança, fundamental no processo deste projeto de educar-se como ser humano.
     A curiosidade se apresenta como elemento fundamental neste processo, pois move a pessoa a conhecer, compreender e buscar a razão de ser das coisas. Pela curiosidade somos seres disponíveis a indagação e a perguntas que expressam a possibilidade de conhecer. Com esta base fica difícil compreender a memorização forçada que se aplica em sala de aula. A mera curiosidade espontânea, em sala de aula, pode tornar-se epistemológica, pela reflexão crítica e metodologia que converterá o conhecimento comum em conhecimento científico.
      O papel do educador é lançar desafios à curiosidade dos alunos, fazendo valer inúmeros recursos em sala de aula, no contexto escolar, onde se desvelam verdades escondidas a partir desta provocação.
      O pensamento “as coisas são assim porque não podem ser de outra maneira” vai na contramão da curiosidade, da criticidade, da liberdade de buscar informação e conhecimento. Historicamente, governos dominadores preferem podar o cidadão, com indivíduos passivos, que não pensam nem contestam, treinados nas escolas, em vez de formar para a democracia, protestando e transformando o mundo.

Referências: 

Freire, Paulo. À sombra desta Mangueira. Livro. Editora Olho D água. São Paulo, 2000. Pg. 74-82.

sábado, 11 de novembro de 2017

Altas habilidades: característica ou problema?

     Trabalho há quinze anos com educação infantil e tive vários alunos com altas habilidades, um desempenho destacado em algum aspecto nos seus desenvolvimentos.

    Porém, ao longo dos anos, muitas situações se apresentaram e equivocadamente, não compreendemos e nem tomamos nenhuma atitude para acompanhar, conduzir ou favorecer o aluno, por desconhecimento. Ocorreu que confundimos as características de alunos com altas habilidades com um problema.
     O caso mais interessante foi de um aluno do Berçário 2, que há 14 anos atrás, passava as tardes correndo em círculos ao redor da sala e não se socializava. No ano seguinte o tive novamente, então no Maternal, e se mostrava impaciente, hiperativo, não participava de nenhuma atividade proposta, brincava sempre isolado, falava sozinho coisas desconexas e corria pelo pátio com um graveto apontando para o céu. Lembrava muito o personagem do filme “Uma mente brilhante” (Ron Howard, 2001) e realmente estava certa. Na época chegamos a pensar em autismo ou um déficit intelectual, mas a verdade só se revelou quando ingressou no ensino fundamental. 
     O aluno em questão, hoje, tem um altíssimo nível cognitivo e é um expert em diversas áreas do conhecimento. Já foi premiado em várias olimpíadas de matemática e homenageado a nível estadual por projetos de Ciências, recebendo cursos e bolsas por seu desempenho. Em inglês está em um nível avançado para sua idade, destacando-se consideravelmente.

   Acredito que a rotina escolar deve ter sido tediosa e sua energia precisava ser liberada. Seus pensamentos, certamente, estavam bem além das atividades que eram sugeridas. Suas habilidades eram outras e estavam se articulando em sua mente.

    Esta situação poderia ter sido tratada de outra maneira, como até chegamos a pensar na época, com um atendimento individualizado e com uma sala de recursos, onde poderia realizar as coisas que gostava, mas por desconhecimento nada foi feito. E ainda surgiu a questão: “porque ele tem que ter atendimento diferenciado, se não é diferente de ninguém”, “se os outros tem que se adaptar, ele também tem que se acostumar.” Durante a hora do soninho era um stress enorme, pois ele rolava de um lado para o outro, suava e ficava impaciente, sem nunca dormir. 
     Atualmente existe um esclarecimento maior a respeito dos superdotados e com altas habilidades, mas as características apresentadas no caso exemplificado foram mal interpretadas, como falta de limites em casa e talvez alguma perturbação ou retardo. Se tivéssemos uma orientação, a respeito do seu comportamento, de um psicólogo poderíamos ter olhado este aluno com outros olhos e assistido melhor em suas diferenças.



Referências:
 Cupertino, Christina Menna Barreto. SÃO PAULO (Estado). Secretaria da Educação. Um olhar para as altas habilidades: construindo caminhos/Secretaria da Educação, CENP/CAPE; organização, São Paulo: FDE, 2008


domingo, 5 de novembro de 2017

Preconceito: revendo padrões e conceitos


      O discurso atual de igualdade, inclusão, respeito às diferenças e sem preconceitos nem sempre condiz com a realidade. 
     O ser humano é, em essência, livre de preconceitos, pois este não é inato, mas adquirido, ou melhor, aprendido. O meio onde a criança cresce e se desenvolve irá afetar significativamente seu modo de ver e sentir o mundo. E do meio em que está inserida que vai construir seu esquema mental, pois de lá  que terá referencias. 
     Conforme as pesquisas de Allport(1946) e de Adorno et al. (1965) mostram, o preconceito         não é inato; ele se instala no desenvolvimento individual como um produto das relações                    entre os conflitos psíquicos e a estereotipia do pensamento - que já é uma defesa psíquica                  contra aqueles-e o estereótipo, o que indica que elementos próprios à cultura estão          presentes.   (Crochík)
      O preconceito é uma defesa da pessoa, uma forma de lidar com o que lhe causa aflição, o que lhe perturba e provoca, mas que não sabe, inconscientemente, lidar com isso, por desconhecimento, baseado em estereótipos que classificam as pessoas, separando-as por categorias. O sujeito, ainda na infância se apropria de estereótipos, que são produtos sociais e mesmo Freud afirmava: “Contudo. como aquilo que se formou no passado é preservado no presente, podemos supor que aquela dicotomia, por vezes, tome o lugar da experiência."( Crochík)
    Muitas vezes nos surpreendemos com atitudes de pessoas esclarecidas, com posturas preconceituosas em nosso dia a dia e nos questionamos a respeito disso, pois acreditamos que o preconceito deriva da ignorância ou da falta de estudo, atestando, mais uma vez, os nossos próprios estereótipos, de que alguém sem estudo é ignorante e preconceituoso. Bem ao contrário, o preconceito está presente no ser humano de qualquer escolaridade e condição social, e novamente, categorizando as pessoas.
    A criança tende a imitar as pessoas com quem convive, criando padrões de pensamento, não raro coletivos, de uma cultura, grupo étnico-racial ou social. “Papalia (2013) afirma que a criança é exposta - ao que se refere apreconceito - primeiro no ambiente familiar e em seguida quando está em idade escolar e passa a interagir com outras crianças."(Manuel, Oliveira, Silva)
   O educador é um profissional que está diretamente atrelado à formação das crianças, que, preocupados com a construção do conhecimento do aluno, devem atentar-se para os aspectos  motivadores do despertar da curiosidade, abrangendo também as relações interpessoais. Sua influencia tem peso na vida psíquica e emocional do aluno, pois é objeto de transferências, que seriam reedições dos impulsos e fantasias despertadas que trazem como característica a substituição de uma pessoa anterior, comumente os pais, pela pessoa do professor. 
     “Dessa forma, sentimentos de simpatia ou rejeição gratuitos que tanto o professor pode sentir em relação a algum aluno, assim como algum aluno em relação ao professor; podem ter origem nesta premissa, já que os relacionamentos posteriores são obrigados a arcar com uma espécie de herança emocional. Todas as escolhas posteriores de amizade e de amor seguem a base das lembranças deixadas por esses primeiros protótipos.” (Jesus)
     Neste sentido, as pessoas que estão ligadas ao desenvolvimento e formação da criança precisam atentar para seus próprios preconceitos, analisando e revisando seus conceitos, pois existe uma saída para nossas concepções preconceituosas: esclarecimento, informação e boa vontade.

Referencias:
Crochík, José Leon. Preconceito, indivíduo e sociedade. Universidade de São Paulo. 1996.
Acesso em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X1996000300004

Jesus, Angela Vujanski de.  RELAÇÃO PROFESSOR/ALUNO NA EDUCAÇÃO INFANTIL. Pedagogia ao pé da letra. Acesso em: https://pedagogiaaopedaletra.com/relacao-professoraluno-na-educacao-infantil/https://pedagogiaaopedaletra.com/relacao-professoraluno-na-educacao-infantil/


Manuel, Daniela Fiorin Falco Pereira. Silva, Marcus Vinícius. Oliveira, Roselle Fernandes Torres. A origem do preconceito Artigo. Centro Universitário de Itajubá.
Acesso em: http://www.fepi.br/revista/index.php/revista/article/view/260/147










quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Berçários: desafios para o desenvolvimento

   
     Um dos desafios de quem trabalha com Educação Infantil é o que realizar com os pequenos dos Berçários, de modo que não sejam forçados aprendizados que sufoquem com atividades e, em um lado oposto, não somente se cuide das crianças. Muito se fala em estimulação (e mais e mais estimulação), e atividades sensoriais, vista a fase do desenvolvimento em que se encontram, Sensório-motor, segundo Piaget.


     Creio que, como sempre, o bom senso e um olhar atencioso são sempre bem-vindos. Cabe ao professor dar atenção, afeto, estimular a linguagem e os movimentos, e assegurar que as crianças estejam bem alimentadas, asseadas, descansadas, protegidas de qualquer intempérie ou fator qualquer que prejudique e diminua o bem estar das crianças. Porém, desde o nascimento, o bebê começa um processo contínuo de desenvolvimento, conforme avança biológica, psíquica, social, emocional e cognitivamente. Cada dia um novo aprendizado, uma nova experiência que o motivará a seguir adiante no mundo maravilhoso das descobertas e do domínio de suas capacidades.

   
     O bom professor terá um olhar atento sobre as descobertas das crianças e irá instrumentalizar para que ocorram mais avanços e experiências, valendo-se de criatividade e ofereça o elemento surpresa a cada dia, sempre fascinando o pequeno ser. Não é necessário realizar projetos elaborados e usar recursos caros, mas há uma variedade de possibilidades utilizando sucata, objetos simples, ou que a criança conheça, ou elementos da natureza, até mesmo flores que soltam tinta, por exemplo, ampliando a gama de estratégias a utilizar.

     "Ao professor cabe criar desafios fazendo interrogações, dando oportunidades para pensar a fim de estabelecer relações entre as coisas novas que se apresentam e os conhecimentos prévios". (MARQUES)



       Na criança menor de dois anos as estruturas mentais ainda estão começando a se organizar, e após vivenciar esta fase, inicia-se uma nova etapa, a pré-operatória, que se sobrepõe à primeira, como revelou Piaget, para a construção das capacidades humanas e do conhecimento, pela interação com o meio (no caso, a própria sala do Berçário e dependências da escola) e demais crianças, o  necessário para seguir avançando.



Referências: 

MARQUES, Tania Beatriz Iwaszko. Epistemologia Genética. In: SARMENTO, Dirléia Fanfa; RAPOPORT, Andrea e FOSSATTI, Paulo (orgs). Psicologia e educação: perspectivas teóricas e implicações educacionais. Canoas: Salles, 2008.